Em algum lugar dentro da imponente fortaleza que Jake, Wyatt e Grimwald tinham acabado de avistar, seus inimigos estavam olhando para eles.
Numa enorme sala esférica do tamanho de cinco campos de futebol, uma enorme mesa circular de pedra com exatamente o mesmo aspecto, cor e textura do piso, parede e teto ficava no centro, ocupando mais da metade do espaço disponível. Era como se a mesa tivesse sido esculpida no chão, da mesma pedra que foi usada para erguer esta fortaleza.
Ao redor dessa mesa gigantesca, dezenas de tronos de diferentes tamanhos foram distribuídos uniformemente uns dos outros. O material de que foram modelados era exatamente o mesmo da mesa e do resto da fortaleza. Ainda mais incrível, a base desses tronos era uma com o piso, sem sinais de cola ou linhas de demarcação indicando que esses tronos foram colocados aqui após sua criação.
Obviamente, esses tronos também foram esculpidos na mesma pedra que a mesa e toda a fortaleza.
Em cada um desses tronos estava sentado confortavelmente um Jogador, mas alguns estavam ausentes, sua presença foi substituída por versões holográficas de si mesmos. Graças a alguma tecnologia ou feitiço, esses jogadores podiam ver e interagir com os outros membros como se estivessem presentes pessoalmente. Verdadeiramente incrível.
“Eles estão aqui.” Um androide encapuzado, um dos poucos parados timidamente entre dois tronos, resmungou com uma voz tingida de aborrecimento e ressentimento.
“Bah! Eles não estariam aqui se você tivesse feito seu trabalho direito.” Shamash zombou desdenhosamente enquanto olhava para o androide Lich.
O homem moreno na casa dos sessenta ainda estava sem camisa, vestindo as mesmas calças pretas largas, faixa roxa, bandana e um pesado medalhão de ouro de peças retangulares. A adaga que empunhava três meses antes não estava à vista, mas a enorme serra que usava no ombro estava plantada verticalmente no chão à esquerda de seu trono. Ele poderia agarrar o cabo de sua arma a qualquer momento.
Vhoskaud se encolheu de raiva por ser menosprezado, mas se conteve. Ele não estava em sua casa, mas em uma fortaleza secreta das Divindades Perdidas.
Por causa da influência de suas duas respectivas facções principais, que eram verdadeiros gigantes na escala do Universo Espelhado, eles tendiam a favorecer a cooperação entre si quando possível, mas definitivamente não eram aliados.
“Não seja tão duro com Vhoskaud.” Um elegante gigante de rocha com mais de 15 metros de altura, mesmo sentado, olhou para o androide Lich com uma risada. “Nenhum de nós poderia ter previsto que eles seriam derrotados tão facilmente. Lembro que Cypher estava com ele.”
Este gigante ostentava características vagamente humanas, mas sua musculatura era insana. O tipo de rocha que cobria seu corpo não era comum, e armaduras, depósitos de diamantes, pedras preciosas e outros metais preciosos foram incrustados em sua superfície.
No entanto, o que refutou completamente a tese sobre sua humanidade foram seus oito olhos violetas globulares espalhados pelo que servia de rosto. O alienígena não tinha boca, nem nariz, nem ouvido, mas ao vibrar a rocha de seu crânio saíam sons baixos e articulados.
Qualquer um que estivesse atento teria notado que a rocha de seu trono e o chão ao redor estavam ondulando em uma frequência peculiar a cada um de seus movimentos. Ele foi provavelmente quem criou esta fortaleza e o respeito que os outros jogadores presentes lhe mostraram foi a evidência mais reveladora disso.
“Nucnar, você é muito indulgente.” Um alienígena menor, mas mil vezes mais hediondo, riu do gigante. “Você conhece o propósito da Divindades Perdidas. Cada membro que perdemos não é um mero revés. Cypher não era um membro importante, mas era um de nós, não um mero subalterno.”
Quando ele fez essa observação, seus pequenos olhos brancos focaram no bárbaro barbudo de três metros de altura sentado a dois assentos de distância. Sentindo que esta indireta foi direcionado a ele, Azeus imediatamente se sentiu insultado e um relâmpago multicolorido começou a crepitar ao seu redor. Mesmo assim, ele não revidou.
Afinal, era a verdade. Ele não era realmente um deles, mas um mero subordinado em liberdade condicional. A outra razão, menos evidente… era que esse alienígena o assustava. Se Jake estivesse aqui, ele teria reconhecido esse Azeus como o idiota que abateu os refugiados no comboio três meses antes.
O alienígena hediondo que ele não ousava responder chamava-se Belakor e era um príncipe demônio como descrito na Bíblia e nos mitos mais horríveis. Além de ser apenas um pouco menor do que seu colega Nucnar, sua aparência e cheiro podiam fazer até mesmo o veterano de guerra mais endurecido vomitar suas tripas. Como tal, ele era muito diferente dos arqui-demônios arrebatadores com características humanas como Hécate ou Xaverie. Ele era um produto puro do mal, sua aparência combinava com sua maldade.
Uma pele grossa azul arroxeada que lembrava carne em decomposição, um par de asas membranosas raiadas de veias negras, vários pares de chifres e espinhos em seu crânio. Costas de uma cor amarela doentia, sem cabelo e uma mandíbula tão larga que se estendia de debaixo do nariz até as orelhas. O interior era forrado com dentes longos e afiados. Toda vez que falava, sua língua longa, serpentina e azul-doce balançava no ar, enviando uma enxurrada de borrifos de tinta preta na frente dele.
Ao pousar na mesa, a pedra derreteria instantaneamente ao contato. Uma enorme espada, cuja lâmina parecia abrigar o próprio inferno, estava em seu colo, uma de suas garras batia mecanicamente com uma batida de metrônomo.
A beleza suprema sentada diretamente à sua direita, e lamentavelmente pequena comparada a ele, estava ereta como uma flecha, seus olhos fechados, sua tez pálida. Seu seio voluptuoso nunca se elevou como se ela tivesse desistido de respirar. Bem, ela tinha. Para aguentar o fedor de Belakor, resolveu prender a respiração até que a reunião terminasse.
Os outros jogadores presentes não puderam deixar de lhe dar olhares lascivos tingidos de compaixão, mas nenhum deles estava disposto a trocar de lugar com ela.
Com isso, os membros do conselho de emergência começaram a brigar, cada um levantando a voz mais do que o orador anterior. Vhoskaud queria vingança, mas não tinha autoridade nem prestígio para se fazer ouvir, muito menos convencê-los a desconfiar de Jake. Outros como Shamash, Azeus ou a bela sem fôlego optaram por permanecer em silêncio, mas Nucnar e Belakor eram tão grandes quanto barulhentos e estavam dispostos a fazer o que fosse necessário para defender seu ponto de vista.
O gigante rochoso Nucnar não tinha medo de nada nem de ninguém. Ele estava extremamente confiante em sua fortaleza e era da sua opinião esmagar os três vermes que se aproximavam para matar dois coelhos com uma cajadada só. Apesar de sua atitude, Belakor compartilhou sua opinião, mas sentiu que estava abaixo dele se esconder naquela fortaleza para derrotar inimigos tão insignificantes.
Outros queriam ser cautelosos, mas suas vozes eram quase inaudíveis em comparação com as desses dois brutos. E então havia a maioria ausente falando através de seus hologramas. Para eles, esse assunto não era da conta deles e não se importavam com a decisão final. Tudo o que sabiam era que tinham absoluta confiança na Divindades Perdidas e em seus companheiros.
Havia apenas um indivíduo cuja mudez diferia da maioria silenciosa. Com cerca de 6 metros de altura, ele se parecia em todos os aspectos com um guerreiro espartano das lendas, mas sua armadura era centenas de vezes mais avançada. Sua pele era como bronze, seu cabelo comprido saía de seu capacete como fios de ouro, e seus músculos duros como aço. Uma longa capa vermelho-sangue amarrada ao ombro dourado caía até os tornozelos, o que combinava com a crista da mesma cor de seu capacete lhe dava um certo ar.
Mas além de sua aparência, eram suas sobrancelhas em forma de espada constantemente franzidas, seus olhos azuis calmos e claros e seu rosto masculino perfeito que atraíam a atenção. Seu único defeito talvez fosse o grande nariz aquilino que endurecia suas feições e lhe dava um ar desonesto, mas talvez fosse também isso que lhe dava tanto carisma.
“Silêncio.”
Uma palavra. Entregue em um sussurro, pouco mais alto que um murmúrio. Mas quando falou, todos se calaram, inclusive os dois brutos Nucnar e Belakor. Quando ficou satisfeito por ter a atenção de todos, sorriu graciosamente para eles e acenou para o ansioso Lich,
“Primeiro de tudo, não desrespeite Vhoskaud. Ele não é um de nós, mas está sob a proteção de um de nós, Thanatos. Mesmo que ele tenha falhado, tenho certeza que fez o seu melhor. Contanto que matemos esse humano, a missão será retomada normalmente.”
O androide imediatamente mostrou uma expressão aliviada e curvou-se agradecido. O guerreiro espartano então se virou para Nucnar e o repreendeu severamente,
“Sua arrogância o matará. Você, de todas as pessoas, deveria entender as consequências de subestimar seus inimigos. Até que tenhamos uma compreensão completa das capacidades desses três intrusos, usaremos esta fortaleza para recebê-los.”
Não tendo terminado seu sermão, ele então admoestou Belakor,
“Se você está tão ansioso para provar seu valor, vou permitir que você teste o inimigo, mas apenas quando ele estiver dentro da fortaleza. Se você desobedecer e se encontrar em perigo mortal, não apenas não receberá ajuda, mas eu também pessoalmente vou acabar com você. Fui claro?”
O demônio grunhiu mal-humorado enquanto olhava para ele com ódio, mas acabou obedecendo.
“Muito claro, senhor.”
“Bom. Agora, Vhoskaud, conte-nos o que você sabe sobre-“
BOOOOMM!
Assim que a calma e a ordem foram restauradas, um objeto semelhante a um cometa atingiu o centro da mesa, quebrando-a instantaneamente em pedaços. O telhado de pedra esmilgalhado caiu sobre os Jogadores sentados, gritos de pânico ou raiva irromperam aqui e ali enquanto os hologramas se desconectaram um após o outro.
