Os dias que se seguiram foram dos mais difíceis e monótonos que Jake já experimentou, mas também os mais gratificantes e significativos.
Eles se levantavam antes do amanhecer e treinavam de manhã à noite, com pequenos intervalos para hidratação e alimentação. A manhã era geralmente dedicada ao fortalecimento físico, enquanto a tarde era dedicada à prática do manuseio de armas e outras técnicas corpo a corpo.
Lutex não mentiu e um programa personalizado foi de fato planejado para cada um dos recrutas. E o mínimo que se podia dizer é que ele tinha um verdadeiro dom para determinar o limite de um escravo.
Uma vez que o sangue Myrmidiano diluído fosse consumido, o treinamento começaria e com ele seus efeitos. Aqueles que desistiram durante o primeiro treinamento imediatamente viram seu nível de condicionamento físico cair, como se tivessem passado o dia inteiro deitados na cama. Todos os seus esforços do dia foram reduzidos a nada, simplesmente por causa de um breve momento de negligência.
Por outro lado, aqueles que perseveraram até o fim tiveram mais do que apenas os benefícios de um treinamento adequado. Apesar da má qualidade da refeição, sua condição física melhorou, e aqueles que deram tudo de si se recuperaram paradoxalmente melhor após uma boa noite de sono do que aqueles que denegriram certos exercícios.
Muito mais importante do que o corpo, o sangue de Myrmidian era um incentivo para fortalecer a mente. Fazer evoluir a personalidade para nunca vacilar perante as adversidades e as dificuldades. Ter uma mentalidade de vencedor.
Não foi fácil para todos e logo as disparidades entre o progresso dos diferentes recrutas se tornaram óbvias para todos. Especialmente para aqueles cujos níveis eram semelhantes no início.
Jake e Elias desenvolveram uma camaradagem silenciosa muito rapidamente. Os dois pobres homens eram anomalias entre os outros recrutas brancos graduados. O treinamento físico deles era como um castigo que você não desejaria ao seu pior inimigo.
Empurrar, puxar e levantar toneladas de ferro fundido a manhã toda, correr 60km com 200 kg nas costas, tendo que lutar e treinar com um lenço grosso no rosto impedindo-o de respirar; tudo foi projetado para fazê-los ceder.
Lutex percebeu rapidamente que eles não precisavam de um dia ou de uma noite de descanso para se recuperarem do cansaço físico e, portanto, dobrou, depois triplicou o número de sessões em 24 horas em detrimento do tempo de sono.
Os efeitos do sangue eram limitados, assim como a quantidade e a qualidade da comida, mas mesmo assim Jake e Elias rapidamente ganharam força. Os benefícios do sangue eram mínimos, mas se refletiam diretamente em suas estatísticas de Éter.
Após uma semana de treinamento, Jake e Elias ganharam 1 ponto de Éter em Força, Agilidade, Vitalidade e Constituição, que era uma quantidade significativa de Éter puro. Quanto ao Status Corporal, sua Força aumentou em 3 pontos, assim como sua Vitalidade, um sinal de alto metabolismo.
Sua constituição havia diminuído comparativamente, apesar do ganho de resistência, um sinal de que sua dieta era insuficiente. Os rápidos ciclos de destruição e regeneração celular associados ao treinamento exigiam uma alta ingestão de calorias e proteínas que o ludus não fornecia. Seu ganho de força foi apenas consequência de uma adaptação do sistema nervoso.
Mesmo com sua extrema resistência, seu estado de saúde piorou, seus tendões e articulações tornaram-se cada vez mais doloridos, enquanto sua massa muscular derretia. Eles não estavam mais se recuperando tão bem. Um caso típico de overtraining1 que levaria a lesões se eles continuassem neste regime.
Apesar disso, nem Jake, nem Elias ousaram reclamar, muito preocupados que o sangue Myrmidiano neles fosse ativado e considerassem suas queixas como uma admissão de fracasso.
Depois de um tempo, Jake acreditou que entendia como o sangue funcionava.
Emoções e mentalidades positivas ativaram o sangue, assim como as emoções negativas, como medo, fraqueza ou uma sensação de derrota. No mínimo, a tarefa em questão deveria ter algum significado. Não se enfraquecia nem ao menor momento de preguiça, caso contrário, tal vida seria insuportável.
Depois de discutir isso com Xi, ele sentiu que uma pessoa que conseguia controlar conscientemente suas emoções talvez pudesse se tornar mais forte sem fazer nada. Uma espécie de estado de espírito vitorioso, mesmo na derrota.
Lutex confirmou que isso era possível. As crianças Myrmidianas, muito positivas e confiantes, rapidamente superaram seus colegas. As famílias nobres, portanto, instalaram extrema arrogância em seus filhos desde tenra idade, lembrando-os constantemente de como eles eram excepcionais.
Mas houve uma exceção. Duelos entre dois Myrmidianos ou pessoas que consomem sangue. Nesse caso, sempre houve um vencedor. E o sangue do vencedor, por definição, sempre dominaria o vencido, vampirizando-o de sua força. Acreditar-se incrível quando não era pode levar a um doloroso retorno à realidade.
À tarde, aprenderam a manejar as armas de sua escolha, passando a maior parte do tempo praticando as sequências que Lutex lhes ensinava. Depois da lição do dia, eles praticavam batendo em postes de madeira (palus) ou contra outros recrutas.
Elias era o parceiro de treino de Jake e eles rapidamente adquiriram o hábito de lutar entre si. Com bom senso, mantiveram uma atitude muito voltada para o time, não tentando derrotar um ao outro em duelos amistosos.
Eles precisavam de um adversário do mesmo nível para treinar com eficácia, e pedir para lutar contra o Lutex era absolutamente impossível. A derrota de um deles teria quebrado esse equilíbrio. Desta forma, os dois foram capazes de compensar suas deficiências marciais sem problemas.
Isso nem sempre foi verdade para todos. Muitos recrutas foram feridos ou derrotados nessas lutas amigáveis e os confrontos entre Laranjas e Vermelhos foram particularmente duros.
Kyle foi derrotado várias vezes, mas também teve várias vinganças em troca, conseguindo manter o status quo em troca de alguns hematomas. Nem todos podiam reivindicar o mesmo.
Yerode e Lamine foram os dois flagelos dos Ludus para os novos recrutas. Os dois Jogadores tiveram um prazer malicioso durante os primeiros dias em pulverizar os poucos participantes que tiveram a má ideia de treinar com eles. Isso os deu um aumento significativo de Éter no início, mas desde então ninguém quis praticar os movimentos que aprenderam com eles.
Eles haviam tentado forçar os duelos, mas Heitor, o número três dos Ludus, havia acabado com suas travessuras quando os forçou a praticar com ele por uma tarde inteira. Depois disso, os dois mercenários mostraram-se muito mais calmos e reservados.
Lu Yan estava treinando sob a supervisão de Khazus e era evidente, para dizer o mínimo. O gladiador compartilharia suas refeições com ela, garantindo-lhe uma dieta luxuosa e balanceada, para desgosto dos outros recrutas.
O progresso da jovem também foi impressionante, sua técnica mudando e evoluindo em uma velocidade vertiginosa. Às vezes Jake se perguntava se era um idiota completo ou se Lutex era um péssimo professor. De qualquer forma, a realidade estava bem diante de seus olhos. Ela estava aprendendo mais rápido do que eles.
De vez em quando, Jake também notava Servius Cassius observando seu treinamento de sua varanda. O homem de meia-idade deu a impressão de estar despreocupado, mas não havia dúvida de que estava examinando tudo. Nenhum evento ocorrido dentro do Ludus estava além de seu alcance. Bem, quase.
Sua esposa, cujo nome aprendeu com Creece, o contrabandista, era Licinia, era tão instável quanto seu comportamento a entregava. Também aparecia na varanda de vez em quando para provocar os gladiadores.
Algumas vezes pedia que um gladiador fosse ao seu quarto e ninguém ousaria perguntar ao sortudo o que acontecera quando ele voltasse. Na maioria das vezes, voltavam orgulhosos como pavões, com um sorriso de satisfação no rosto.
Priscus fez vista grossa para as excentricidades da esposa de Cassius, assim como os outros gladiadores e guardas. Jake duvidava que seu marido ignorasse esses adultérios repetidos, mas claramente não se importava. Um casal estranho, muito promíscuo.
Após uma semana de treinamento, cerca de 50% dos escravos falharam em seu treinamento em um ponto ou outro, o trigo do joio foi separado.
Era também o dia em que seriam designados para seu posto provisório e com ele a possibilidade de desafiar um gladiador ou recruta de posto superior. Para Jake, isso significava mais comida.
A tábua de madeira na entrada da cantina indicava claramente os recursos a que tinham direito de acordo com sua categoria. Portanto, sabia exatamente qual nível mínimo precisava atingir para poder comer o suficiente e, finalmente, recuperar as forças.
Ele teve que ser classificado entre os 10 melhores recrutas para se qualificar para uma dieta semelhante à dos gladiadores profissionais do ludus, sem limite de amido e legumes. Teria que derrotar um verdadeiro gladiador para se qualificar para um sangue Myrmidiano menos diluído ou de qualidade superior.
Mais importante ainda, receberia seu primeiro salário. Isso permitiria que usasse o dinheiro recém-ganho para solicitar a ajuda de Creece, o contrabandista. Ele precisava de informações.
Nota:
[1] pegar pesado demais no treino, prejudicando a eficiência.
