“Recebemos resposta.” Jake finalmente respondeu com distanciamento de arrepiar.
Aisling engoliu em seco ao sentir a aura sufocante brotando dele. Naquele momento, ela quase esqueceu que deveria agradecê-lo por sua ajuda. Toda a montanha-russa emocional de encontrar seu pai novamente, ser libertada e, em seguida, ter seu pai recapturado no processo de resgatá-la não melhorou as coisas.
Agora, seu humor e pensamentos estavam um pouco incertos e confusos. A líder forte e carismática havia sido empurrada para segundo plano, momentaneamente substituída por uma jovem tão perturbada e desesperada quanto uma criança perdida em um supermercado.
Wyatt, por outro lado, via as palavras de Jake como a luz no fim do túnel. Seu coração doía por vingança e ele estava disposto a arriscar sua vida para salvar Carmin e se vingar de seus companheiros torturados que Jake havia libertado anteriormente.
Infelizmente, Jake não poderia acompanhá-lo nesta loucura. Sua angústia provinha principalmente do que havia aprendido recentemente nas masmorras da Divindades Perdidas, sua fria racionalidade o censurava.
“Eu não poderei lutar com você desta vez.” Wyatt balançou a cabeça, num tom de desculpas
“Por que?” Jake ergueu uma sobrancelha descontente. Ele não esperava que esse cara fosse um gato tão assustado. “Carmin não é sua namorada de infância?”
Sua repreensão pode ter soado contundente e desdenhosa, mas Wyatt podia entender suas razões. Com exceção de Carmin, que ainda era refém da Divindades Perdidas, os outros vampiros de sua facção presos na masmorra do clã Dracul foram libertados. Pelo menos os que não haviam sido mortos antes de sua captura. Como líder, ele tinha que considerar as opiniões dos outros membros.
Jake não sabia muito sobre este Vampiro bonito que carregava o fardo e a responsabilidade de várias centenas de Vampiros, mas do pouco que havia coletado de Carmin e da informação que sua facção tinha acumulado, Wyatt tinha, apesar de sua imensa força e origens nobres, um temperamento agradavelmente gentil e anti-violento, além de ser pudico, excessivamente educado e empertigado.
Ferir e matar, mesmo quando significava beber sangue para se alimentar, eram para ele atos vis e bárbaros que iam contra seus princípios. Para fazer uma analogia adequada, ele era o que se poderia chamar de um vampiro vegano. Sua busca por virtude e benevolência a ponto de negar seus impulsos fisiológicos só foi possível porque como Vampiro Progenitor ele não era obrigado a consumir sangue para se sustentar.
Sua busca pela bondade e sua recusa em beber sangue, no entanto, tiveram um grande impacto em seu desenvolvimento. Apesar de sua fantástica linhagem, ele era muito mais fraco do que os outros Vampiros Progenitor de sua idade. Seu clã pensou mal dele, então ele fundou a Puro-Sangue com Carmin e alguns outros vampiros nobres de sua geração para provar seu valor para eles.
O poder bruto e a selvageria que mostrou no final da Terceira Provação contra Jake só foram possíveis por causa da Corrupção. Sua verdadeira natureza era muito mais gentil, e mesmo para salvar Carmin ele não havia esquecido completamente sua moralidade.
Contra inimigos mais fracos do que ele, era inconsequente, mas quando se colocava oponentes inescrupulosos de seu calibre à sua frente, suas falhas de caráter se tornavam óbvias.
Em muitos níveis, Wyatt foi responsável pela captura de Carmin e seus antigos companheiros, mas também pela recaptura de Grimwald pelo inimigo. Este último, percebendo que Wyatt não estava pronto para perpetrar um massacre, assumiu a responsabilidade de atrair a atenção dos jogadores inimigos com o infeliz resultado que se seguiu.
Isso foi o que Jake supôs que sabia e entendia sobre Wyatt, e ele não estava totalmente errado. No entanto, a realidade da situação era um pouco mais complexa.
Tão confiante quanto Wyatt estava em sua força pessoal, ele pelo menos teve a previsão e a compostura para sujar as mãos quando não havia outra opção. Poderia ser relutante em usar a violência, mas como Vampiro Progenitor ele tinha uma série de habilidades que lhe permitiam hipnotizar, manipular e até mesmo escravizar as mentes de seus inimigos. Para encontrar Carmin naquelas masmorras labirínticas ele não hesitou em abusar de seus poderes.
Esses Jogadores da Divindades Perdidas eram, sem dúvida, muito durões, mas subjugar um deles para interrogá-lo e vasculhar sua alma estava ao seu alcance. Tendo um bom instinto a esse respeito, ele emboscou um dos Jogadores encapuzados usando uma máscara de cobre grosseira e vasculhou sua memória sem o menor escrúpulo.
Apesar de ter completado facilmente o primeiro estágio de sua infiltração e obtido a localização de Aisling, mas não a de Carmin (o Jogador interrogado não sabia nada sobre isso), também descobriu a verdade cruel sobre essa facção misteriosa.
Quando afundou suas presas na garganta de seu cativo, Wyatt já havia se dado conta de que não seria suficiente matá-lo. Na melhor das hipóteses, apenas incapacitaria este Jogador por alguns dias.
Ele e Jake não eram amigos, nem mesmo aliados, e não confiavam um no outro. Na melhor das hipóteses, eram rivais, respeitando um ao outro. No entanto, sua ética o impediu de manter essas informações para si mesmo. Se Jake tentasse se vingar sem ser devidamente informado, tudo o que o esperava era o extermínio dele, de sua facção e possivelmente de todo o seu planeta natal.
“Jake, antes que você decida se vingar, preciso te contar uma coisa sobre Divindades Perdidas.” Wyatt declarou gravemente, ignorando a repreensão condescendente de Jake: “Esses jogadores, eles são…”
Jake o parou com um gesto.
“Não precisa, eu tenho uma ideia aproximada do que você pretende me dizer.” Jake riu em desânimo. “Mas, minha decisão não vai mudar. Vou me vingar ou vou cair tentando. Se eu não enfrentá-los nesta provação onde é quase impossível morrer, minha classificação será afetada. Essa derrota afetará meu futuro Rank, meu nível de Oráculo Skills e meu poder. Se eu ou meus companheiros morrermos na Quinta Provação por causa da minha covardia hoje, nunca mais poderei olhar na cara deles novamente. Mesmo que tudo dê certo, se eu encontrar a Divindades Perdidas novamente, minhas chances de resistir a ela serão ainda menores e serei mais uma vez forçado a recuar. Por causa da minha linhagem e do meu caráter, isso simplesmente não é possível.”
“Sua linhagem?” Wyatt murmurou confuso.
“Você precisa de sangue e tempo para ficar mais forte, eu preciso vencer.” Jake explicou com uma luz fria e brilhante em seus olhos resolutos.
O Vampiro permaneceu perdido em pensamentos por um momento, antes de perguntar com uma expressão determinada:
“Se, e quero dizer se, eu concordar em lutar ao seu lado, como você vai fazer isso? Caso você não tenha notado, esses jogadores são invencíveis. Não será fácil derrotá-los, e até se você conseguir, eles voltarão à vida mais cedo ou mais tarde. A Provação ainda é longa…”
Wyatt já havia se decidido a não revelar o que havia descoberto. Subconscientemente, temia que, ao compartilhar as revelações, Jake perdesse a coragem. Se ele desistisse, sua frágil determinação murcharia instantaneamente.
“Agora sim.” Jake sorriu um sorriso cheio de dentes. “Em primeiro lugar…”
Os dois Jogadores começaram a discutir seu esquema de vingança na presença de Aisling, que ficou cada vez mais chocada ao ouvi-los desvendar seu plano nefasto. Alguns minutos depois, Wyatt se despediu deles e marcaram um ponto de encontro na caverna subterrânea onde Jake vinha treinando nos últimos três meses.
Mesmo que seus inimigos soubessem sua localização, sem o poder de atravessar terra e metal, era quase impossível alcançá-la. Quanto a Aisling, ela ficou com Jake.
A dupla voou para o esconderijo de Jake e o Demônio Dhampir quase morreu de ataque cardíaco quando ele a pegou pela mão e atirou no chão como uma flecha. Embora a morte horrível esperada nunca tenha acontecido, quando ela abriu os olhos alguns momentos depois, foi recebida por uma rajada de ar escaldante, sulfuroso e com pouco oxigênio que a fez quase se arrepender de ainda estar viva.
Quando viu onde estava, por um breve segundo ela se perguntou se estava realmente morta e enviada para o inferno para pagar por seus crimes. Não foi até que ela encontrou a companhia relaxada e estoica de Jake e ouviu o zumbido brincalhão de Jeanie que ela finalmente conseguiu relaxar.
Aisling não ficou nem um pouco surpresa ao ver Jake agindo como um peixe na água nesse ambiente, mas ver a pequena fada fechar os olhos e suspirar de satisfação como se aquele fosse o lugar mais aconchegante do mundo a desconcertou bastante. Ao contrário dela, não havia nada de especial na constituição e vitalidade da Minmin.
E, no entanto, os fatos estavam bem diante de seus olhos.
Assim que chegaram, Jake formalmente convidou Aisling para se juntar aos Nerds Myrtharianos. Por causa da censura do Sistema Oráculo, ela não tinha entendido toda a sua conversa com Wyatt, mas tinha descoberto o suficiente para saber que esses Culpados tinham facções diferentes e que aceitar seu convite significaria jurar lealdade a ele.
No fundo ela estava hesitante. Sabia que devia muito de sua liberdade a esse Jogador, mas se isso significasse abandonar os Mutantes de Laudarkvik, então ela não conseguiria fazê-lo.
Jake podia sentir sua relutância e explicou claramente os prós e contras de se juntar à sua facção. Aisling finalmente descobriu por que Jeanie estava tão à vontade nesse ambiente inabitável. Como um gesto de boa fé, ele ofereceu a ela liga líquida suficiente para criar outra pulseira, tornando-a oficialmente uma Jogadora.
Ou em suas próprias palavras, uma Culpada.
Com seu próprio Dispositivo Oráculo, Aisling não era mais tratada pelo Sistema Oráculo como nativa, mas como uma Jogadora de pleno direito. Jake agora podia explicar seus planos, seus objetivos e suas origens para ela sem ser impedido por qualquer censura, a menos que a restrição viesse do Oráculo.
Depois de finalmente ter uma visão completa da situação, Aisling parou de hesitar e aceitou o convite. Com o recrutamento feito, Jake entrou no chat público dos Nerds Myrtharianos e começou a digitar uma mensagem…
